Um dia, um amigo meu disse-me uma frase que cai como uma luva neste momento: “não crie expectativas, crie unicórnios!”. Parece cômico, mas até faz sentido sobre a boa e velha expectativa, algo que nunca parece ter um resultado exato: ou você se exalta com o resultado, confirma o que esperava ou, pior, se ilude fragorosamente com o não acontecimento.
Para os seguidores do mundo da música, esperar ansiosamente pode, muitas vezes, acabar numa tremenda decepção. E um dos campos onde isso mais se pega é onde, talvez, o emocional humano e os egos estão mais aflorados no ambiente musical: a reunião de bandas separadas ou terminadas há algum tempo.
São inúmeros motivos que levam a tanto, mas para o bom fã não importa o motivo, só o fato de pensar numa reunião e se agarrar a pistas, evidencias e falas dos ex-integrantes sobre possíveis reencontros. As vezes, a reunião é extremamente casual, quase uma coincidência, mas na maior parte das vezes, só gera um hype grande para terminar numa quase certa ilusão.
O recente exemplo, talvez o mais recorrente neste preâmbulo, é os irmãos Gallagher e as tantas possíveis reuniões do Oasis. Eles voltaram a ser evidência depois de disparar teaser misteriosos nas redes em uma época onde coincidir com os 30 anos do disco de estreia da trupe – o “Definitly Maybe“, de 1994 – podia significar, enfim, o tão aguardado reencontro e paz aos irmãos, separados desde 2009 após uma briga feia nos bastidores de um show em Paris.

Para surpresa de zero pessoas e uma nova desilusão dos fãs, o anuncio misterioso era apenas um terreno preparado para a divulgação da versão de 30 anos do disco de estreia, que chega aos streams em agosto deste ano, trazendo versões inéditas e takes não utilizados das gravações na Cornualha. É um entre tantos momentos em que os fãs do Oasis, outra vez, suspiram entristecidos, acumulando ai as declarações dos dois irmãos, ora dando esperanças ora deixando claro que uma reunião é impossível.
Vindo de uma banda inglesa, é algo que não surpreende. Os Beatles passaram os anos 1970 alimentando fortemente a possibilidade de uma reunião depois do fim do grupo após o “Let It Be“. Havia uma expectativa para que este reencontro acontecesse no “Concerto para Bangladesh“, em 1971, além de outras mil especulações que pipocaram vigorosamente até o assassinato de John Lennon, em 1980.


O máximo que foi conseguido de reencontro do fab four mesmo foram os encontros entre Paul McCartney, Ringo Starr e George Harrison durante as produções do “Anthology“, em 1995, que resultaram ainda em faixas inéditas como “Free As a Bird” e “Real Love“, aproveitando-se da voz de Lennon registrada no passado. Fora isso, qualquer encontro entre Macca e Ringo é celebrado como grande notícia e “Now And Then“, lançada ano passado, foi o último respiro dos quatro juntos.
E outra: até parece que os britânicos adoram essa coisa de separar-se e atiçarem fanbases com possíveis reuniões. Outros três exemplos meio que se seguiram na esteira dos Beatles, dentro desta linha de corações partidos. Nomes do naipe de Supertramp, Pink Floyd e The Smiths ilustram bem esse cenário e qualquer pista de um reencontro vira manchete de capa em sites especializados.

Em 1983, na impossibilidade de continuação da banda por divergências criativas, Roger Hodgson anunciou sua saída do Supertramp, deixando Rick Davies a frente do grupo até hoje Até ai, tudo bem, mas as divergências passaram para problemas com direitos autorais e declarações acaloradas de ambos os lados que literalmente sepultaram qualquer reunião. Davies segue com o Supertramp e Hodgson curte a carreira solo, ambos tocando e recordando sons dos bons tempos, mas nada além disto.
Ruídos também passaram pelos bastidores de Pink Floyd e The Smiths, cujas reuniões praticamente se inviabilizaram até pela morte de ex-integrantes de ambos. No primeiro, a última reunião com os membros originais foi em 2005, para o Live Aid daquele ano e a custa de muita conversa do organizador, Bob Geldorf, com Roger Waters e David Gilmour, que já naquele tempo não se bicavam. Os anos passaram, os dois músicos seguem sem se falar e causando controvérsias até mesmo na celebração dos 50 anos do “Dark Side Of The Moon“, onde cada um lançou sua releitura, fora as declarações e brigas judiciais que se seguiram na esteira.


No lado dos comandados de Morrissey, foi justamente a intransigência do cantor que sepultou o fenômeno britânico dos anos 1980 antes mesmo da década acabar. o Smiths dominou paradas com canções icônicas até hoje, mas as divergências de estilo do grupo entre Morrissey e Johnny Marr colocaram um ponto final a qualquer possibilidade de revival. Para completar, o baixista Andy Rourke morreu em 2023 e conversas sobre reunião, apesar de recorrentes vez em quando, não caem mais na pauta nem de Morrissey nem de Marr.
Completando esta curta lista, fora do Reino Unido e, talvez, muito mais compreensível do que os casos citados, o ABBA é um exemplo de reunião aguardada que até gerou frutos, mas deixando claro que outros encontros não aconteceriam. O hiato do quarteto sueco desde o último disco (“The Visitors“, de 1981) durou até 2021, quando “Voyage” veio ao mundo, deslumbrando fãs e arrastando uma onda de shows virtuais de alta tecnologia e indicações em várias premiações.
No entanto, ver os quatro no palco outra vez não será possível, e não que seja por intransigência, mas uma questão de “tempo passado”, segundo a análise fria de Benny Anderson e Bjorn Ulvaeus, as mentes criativas do grupo. O próprio Bjorn já deixou claro várias vezes que, depois do “Voyage“, nada mais de novo do ABBA viria além dos shows virtuais com hologramas. Uma reunião para o Eurovisão deste ano em Malmö (Suécia), recordando os 50 anos da vitória do grupo no Festival, chegou a ser cogitada, mas rechaçada pela trupe.

Ou seja, sonhar com reuniões de grandes bandas do passado é permissível para muitos. Imaginar como seria continuar uma história em novas roupagens e ideias musicais é uma ilusão constante, sem contar a possibilidade de ver antigas lendas dos palcos fazendo o que sabiam fazer de melhor no passado. Mas nunca estamos preparados para as ilusões que seguem, motivadas por questões muito além dos shows.
Diante disto, o melhor mesmo é se agarrar as lembranças e ouvir em looping os sons dos tempos gloriosos destas legendas do mundo da música. Talvez, o peso da ilusão seja até menor na hora que uma nova “pista” surgir no horizonte.
Oasis que o diga…